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Observando Hugo Cabret

Um filme que demonstra compreensão total de um diretor pela alma daquilo que ama

por Fábio M. Barreto
Capa - Observando Hugo Cabret

A busca por inspiração e a compreensão da linguagem e decisão daqueles que admiramos é algo comum no entretenimento e, provavelmente, em toda redação criativa. Alguém já fez algo bem, por que não compreender e concentrarmos a atenção na evolução em vez da perpetuação de erros, não é mesmo?

Pensando assim, tenho assistido muitos filmes durante a preparação para as filmagens do meu tão esperado curta-metragem, “The Flower Shop” (cujo um dos patrocinadores é o B9 e que já comentei aqui durante a fase de crowdfunding), e por conta da natureza de “filmes de época” optei por colocar “A Invenção de Hugo Cabret” na lista dos títulos mais importantes dessa seleção. Além da homenagem descarada às origens do cinema, elemento que, aliás, ainda me tira lágrimas por conta do trabalho de Ben Kingsley, notei algo mais sutil, algo mais marcante e fundamental nas escolhas de Martin Scorsese. “Hugo” é um tratado cinematográfico sobre a observação e pontos de vista.

A constatação deveria ser clara depois daquele impressionante passeio por Paris e pela estação de trem logo na abertura, entretanto, nas primeiras assistidas, fiquei encantado pela história e perseguindo cada referência possível a George Méliés e aos primórdios do cinema. Foi mais um mergulho naquele mundo entre-guerras, nos detalhes que Scorsese optou por mostrar.

Hugo
De certa forma, assistimos um filme dentro do filme de outro filme. Hugo, Méliés e a obra de Méliés e dos Lumiére.

Anteontem, assisti novamente analisando tecnicamente e além de perceber que, exceto pelas grandiosas tomadas com grua e o uso limitado de steadi cam, o diretor optou por cortes secos na maior parte do filme. Ele quase não move a câmera; quem tem fluidez são os personagens e aquilo que eles veem. Arrisco apontar a composição das tomadas ter cerca de 25% de pontos de vista.

Muito por conta da natureza do assunto homenageado – o cinema, onde todos são espectadores e espiam por uma janela por vezes convidativa, por vezes assustadora – os personagens de Hugo Cabret também estão observando. Eles veem os detalhes, ou seja, quase nada de inserts (close ups fechados de objetos ou ações) mecânicos ou pontos de vista neutros.

Alguém sempre está olhando, seja Hugo, seja Méliés, seja o próprio Autômato. Tudo é motivado e reforça o conceito da relevância do cinema. Méliés surtou quando viu os sonhos perderem a batalha para o realismo e a dor, do mesmo modo Hugo sonha com os detalhes da realidade idílica na qual vive, mesmo contra qualquer razão lógica. Sozinho, ele não busca ajuda; ele continua a projeção na esperança de um fim milagroso, como nos filmes.

“Cinema trata do que está na tela, e do que não está” – Martin Scorsese

Hugo

Hugo

A variedade de pontos de vista, de intensidade na observação e mo grau de maravilhamento vivenciado pelos personagens graças a essa escolha de Scorsese é intrigante. Ele costuma dizer que “cinema trata do que está na tela, e do que não está”; Hugo trabalha, e questiona, esse conceito de forma profunda. Se estamos observando, quem vê o que sentimos? Até que ponto a sensação alheia pode refletir no estado de espírito do observador? O cinema é mesmo limitado àquilo que se vê ou se escuta? Em muitas ocasiões, um poderoso “reaction shot” vale mais do que mostrar uma tragédia. Na dinâmica da vida de Hugo, todos são personagens, menos ele. Quem o observa é inanimado.

Quando isso muda, a linguagem muda. Ele passa a figurar mais e o medo inicial deixa de ser o único tom quando ele ri, corre riscos e, mesmo sem perceber, se apaixona. De certa forma, é a trajetória de Méliés, que o observava mesmo sem que o garoto notasse. Sentado atrás do balcão, o cineasta sonhador via um mundo no qual era incapaz de provocar efeito, de despertar o devaneio, de criar sorrisos.

Em vez de concentrar esforços na redescoberta da visão de Méliés, Scorsese transfere toda essa carga para as crianças e o efeito é o mesmo. Eles descobrem, exploram, observam e são observados. O diretor aproveitou cada ângulo dos cenários, cada possibilidade maluca criada pelas cenas em CGI e sempre nos manteve espiando.

Hugo

De certa forma, assistimos um filme dentro do filme de outro filme. Hugo, Méliés e a obra de Méliés e dos Lumiére. Esse tratado sobre pontos de vista torna “A Invenção de Hugo Cabret” um filme muito mais relevante do que o apelo histórico e romântico inicial, e demonstra compreensão total de um diretor pela alma daquilo que ele ama. Ele inclusive explica isso na cena em que Hugo mostra a cidade vista do alto a Isabelle. “É assim que eu vejo tudo!”, diz o garoto.

O cinema é mesmo limitado àquilo que se vê ou se escuta?

Adaptar a percepção da realidade era, ao mesmo tempo, a única defesa contra a solidão e o desespero, e a arma para concluir aquele objetivo tão sonhado. Pensando como alguém envolvido com criação, a simplicidade e a obviedade dessa característica não deveria gerar muito espanto, porém, a busca por algo a mais sempre funciona como uma barreira. Mesmo que encontremos algo, ele está em outro lugar. Alterar o mundo, em vez de esperar que ele nos altere, pode ser a melhor solução, não é?

Reveja e preste atenção no mundo editado pelos olhos de Hugo, em suas preocupações, medos e sonhos, todos revelados pela câmera sensível de Scorsese. As surpresas estão lá, esperando por você!

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Fábio M. Barreto é jornalista, cineasta e autor da ficção científica “Filhos do Fim do Mundo”.

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