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Capa - “Manchester à Beira-Mar” é um grande filme sobre perdas

“Manchester à Beira-Mar” é um grande filme sobre perdas

Grande elenco comandado por Casey Affleck e direção precisa de Kenneth Lonergan são as bases de mais um ótimo melodrama

por Virgílio Souza

Numa indústria em que as narrativas de ascensão parecem seguir moldes pré-estabelecidos, escapando pouco de determinados padrões de sucesso, a carreira de Kenneth Lonergan se apresenta como um caso curioso. Consolidado como autor de peças de teatro desde a década de 1990 e dono de certo respaldo como roteirista de cinema, o nova-iorquino apresenta agora, mais de quinze anos depois de sua estreia, apenas seu terceiro longa como diretor.

Os intervalos entre seus projetos não são tão incomuns nem longos o suficiente para causar espanto. Entre um filme e outro, Lonergan se manteve ativo como dramaturgo, recebendo indicações a prêmios do gabarito do Pulitzer. Foi em uma dessas ocasiões que o também-cineasta se deparou com “Manchester à Beira-Mar”, roteiro inicialmente concebido por John Krasinski (o Jim, de “The Office”) e Matt Damon (que já havia trabalhado com ele em outras oportunidades).

A ideia de levar para as telas a história de um zelador encarregado de criar o filho do irmão falecido parece adequada. “Conte Comigo”, seu primeiro trabalho na direção, lidava com sensações semelhantes, e o drama, apesar de seguir uma estrutura mais simples, atingia notas parecidas. A capacidade de encontrar emoção genuína nos acontecimentos mais simples une ainda mais os dois filmes, sustentados nas mesmas ideias de perda, culpa e solidão. Se ali o protagonista enfrentava o medo de morrer na cidade da infância, aqui o pavor de Lee (Casey Affleck) é de envelhecer nela, insignificante e consciente de seu fracasso.

Casey Affleck, Lucas Hedges e o diretor Kenneth Lonergan no set

Em “Margaret”, seu segundo longa, a história é um pouco diferente. Uma versão bastante resumida relata que o corte de Lonergan ultrapassava as três horas de duração, mas o contrato exigia não mais que 120 minutos, o que levou Sydney Pollack, um dos produtores, a contestar seu “comportamento amador e irracional” na função.

De volta à ilha de montagem para cortar um terço do filme, ele contou com a ajuda da montadora Thelma Schoonmaker e de Martin Scorsese, que chamou o que viu à época de “obra-prima”. Apesar dos elogios e do elenco recheado de estrelas, porém, o resultado passou longe de decolar nas bilheterias quando foi lançado, seis anos depois.

Controvérsias à parte, o que se vê na versão distribuída ainda mais tarde em home video é mesmo uma das coisas mais impressionantes do cinema americano recente. O corte assinado pelo diretor, cravado em 186 minutos, se desdobra como um melodrama urbano moderno e complexo, que captura as melhores qualidades do romance ao mesmo tempo em que proporciona em uma experiência de cinema sem igual no panorama independente do país — alguém certa vez definiu o filme como “um diamante bruto”, e essa imagem se mantém apropriada.

É a maneira de organizar as cenas e de construir sentido através de ordenamentos que torna o filme tão potente

Tudo isso não é apenas pano de fundo. “Manchester à Beira-Mar” é um herdeiro legítimo dessa trajetória, e conhecê-la ajuda a entender o impacto que essa experiência do diretor na dramaturgia, que rendeu ao menos dois ótimos longas, tem no que se vê em cena. Antes de mais nada, a sensação é de que a força do filme decorre diretamente do trabalho de montagem, justamente sua pedra no sapato no passado, aqui comandado por Jennifer Lame.

Especialmente quando avança no tempo atual, o filme conserva uma aparência quase neutra, como se, em vez de buscar traços mais expressivos, preferisse se posicionar sempre nos cantos dos cômodos a fim de observar os movimentos daquelas pessoas, suas condutas refletindo ou escondendo suas relações e sentimentos. A proposta do fotógrafo Jody Lee Lipes acompanha as principais decisões estilísticas de Lonergan, que busca naturalismo também nas performances. Por parecer comum, “Manchester” desperta sentimentos tão fortes; por lidar com sentimentos tão fortes, nunca é exatamente comum.

É a maneira de organizar as cenas e de construir sentido através de ordenamentos e perspectivas distintas que torna o longa tão potente. Destaca-se, por exemplo, a decisão de inserir flashbacks ao longo da narrativa (algumas vezes por meio de saltos temporais bruscos), colhendo tanto momentos cruciais do passado, que garantem as principais explosões de drama, quanto alguns de seus instantes mais banais, que preservam essa atmosfera realista.

O principal interesse de Kenneth Lonergan é pelas coisas não resolvidas, pelos personagens que não conseguem resolvê-las

Assim como em seus filmes anteriores, o luto carrega tanto peso quanto a morte. O que interessa a Lonergan acima de qualquer coisa é como os vivos lidam com a partida. Se “Conte Comigo” tinha uma abordagem mais discreta e “Margaret” arriscava um experimento formal mais amplo, aqui tudo parece limitado pelos contornos da cidade que dá nome ao filme. Os personagens não conseguem escapar das próprias vidas, são sempre atraídos de volta para o passado, para os mesmos espaços, as mesmas pessoas, os mesmos dramas eternos.

Nesse sentido, os interlúdios, quando a música ganha volume, ajudam a deslocar a percepção do campo dos fatos, dos acontecimentos da trama em direção ao campo dos sentidos, das emoções que esses mesmos acontecimentos provocam. Um convite para almoçar como o de Randi (Michelle Williams) pode ser tão doloroso quanto uma separação traumática; uma atividade ordinária como abrir um freezer pode despertar sensações tão confusas e inexplicáveis quanto perder um familiar. Contexto importa quando se fala de dor, e todo o elenco, de fato sem exceção, se porta de acordo com essa noção, dosando seus ritmos e posturas de acordo com as circunstâncias e o tamanho da bagagem carregada.

Em “Conte Comigo”, Lonergan explorou um trauma de infância e, em “Margaret”, um trauma coletivo. Essas duas ideias retornam: Patrick (Lucas Hedges) perde o pai ainda jovem, o que abala tanto sua vida quanto a trama, ao passo que Lee volta a ser condenado por seus erros, o que ganha corpo nas reações da cidade ao seu retorno. Mesmo lidando com questões sérias, agravadas porque permanecem atormentando o protagonista, o filme jamais se desvia para o sofrimento gratuito.

O principal interesse do diretor é pelas coisas não resolvidas, pelos personagens que não conseguem resolvê-las. “Algumas pessoas não conseguem superar; por que elas não podem ter um filme também?”, ele questiona. Se “Manchester à Beira-Mar” é sua nova resposta para a pergunta, não há dúvida: elas podem e devem — e, pela terceira vez seguida, renderam uma grande obra.

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