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“Bingo: O Rei das Manhãs” é um retorno empolgante aos anos 1980

Primeiro trabalho de Daniel Rezende na direção tem energia da época e uma boa dose de emoção

por Virgílio Souza

⚠️ AVISO: Contém spoilers

Ao longo dos últimos quinze anos, Daniel Rezende se consolidou como o montador mais requisitado do Brasil, formando parcerias marcantes com diretores como Walter Salles, Fernando Meirelles e José Padilha, e, no processo, conquistando enorme respaldo pessoal. Após acumular experiência em um currículo que conta com produções como “Cidade de Deus”, “Diários de Motocicleta” e “Tropa de Elite”, ele assume a cadeira de direção pela primeira vez em “Bingo: O Rei das Manhãs” e dá novas (e empolgantes) razões para elogiarmos seu trabalho no cinema.

Inspirado na vida de Arlindo Barreto, um dos intérpretes do palhaço Bozo na televisão brasileira na década de oitenta, o filme se vale de elementos típicos de cinebiografias tradicionais para contar sua história. No entanto, a atenção para aquilo que cerca o personagem principal já se faz notar desde a sequência de abertura, que define o tom expansivo da época enquanto passeia por diferentes canais da programação. Mesmo quando a estrutura leva a viradas convencionais, há uma tentativa constante por parte do diretor de se desviar dos ângulos mais batidos desse tipo de narrativa e oferecer algo com identidade própria.

Daniel Rezende, à direita, com Leandra Leal e Vladimir Brichta no set

Aqui, o protagonista se chama Augusto Mendes (Vladimir Brichta), um ator de pornochanchadas como “O Abajur do Amor” que encontra sua oportunidade de fazer fama animando auditórios cheios de crianças cinco dias por semana, pelo menos quatro horas por dia. A busca por reconhecimento é uma tema logo de partida. Por isso, acompanhamos sua frustração com o estado da carreira, o processo de aprendizado da nova função e a dificuldade para se adaptar às pressões constantes de um emprego no ramo do entretenimento. Essas são etapas naturais em tramas de ascensão e queda de artistas, mas Rezende tem interesses específicos que deslocam o olhar do filme para outra direção.

Tendo os bastidores da televisão nacional como palco, o diretor, amparado pelo roteiro de Luiz Bolognesi, molda um retrato daquela década que serve de apoio para a trajetória conturbada do protagonista. O apelo à nostalgia fica mais evidente em algumas oportunidades, como nas aparições pontuais de determinados produtos e na participação curta, mas memorável de Gretchen (vivida por Emanuelle Araújo). O objetivo principal, no entanto, parece ser colocar em contexto toda a energia do personagem principal, dando força à sensação de que somente naquele tempo e espaço uma figura como Augusto/Arlindo poderia dar vazão a sentimentos tão desordenados em rede nacional — e conquistar fama duradoura por isso.

Tendo os bastidores da televisão nacional como palco, Daniel Rezende molda um retrato da década de 1980

Nesse sentido, a espontaneidade que domina suas performances é resultado de um conjunto de fatores. A atuação de Brichta é o que salta aos olhos mais facilmente, com variações entre o drama e a comédia, o desespero e o êxtase, capazes de torná-lo mais complexo do que o truque de maquiagem sugere. Seus objetivos são claros, mas os rumos tomados para atingi-los permanecem confusos durante boa parte do tempo, e caminhar ao seu lado, na imprecisão de seus erros e acertos, se prova um dos aspectos mais cativantes do filme.

A ideia de que tudo ocorre em tempo real é essencial para dar peso a ações imprevisíveis do palhaço (e do homem)

Simultaneamente, as decisões tomadas por Rezende servem para valorizar o trabalho dos intérpretes. As lentes se aproximam de seus rostos com frequência e permanecem neles por algum tempo, como se o montador Márcio Hashimoto desse margem para que eles expressassem diferentes emoções dentro de um mesmo plano. Lucia (Leandra Leal), responsável por dirigir o programa e controlar os ímpetos de Augusto no set de filmagens, é um caso emblemático: até quando se esforça para manter a postura séria, característica básica de sua personalidade conservadora, um riso contido insiste em surgir na presença de Bingo.

Nos momentos em que o fotógrafo Lula Carvalho coloca a câmera em movimento, a proposta mantém uma linha semelhante. Ao esconder os cortes em longos planos-sequência que seguem o protagonista do camarim ao palco, a direção cria um senso de urgência fundamental para a condução da história; e, ao fazer com que os atores interajam com os espaços enquanto se movimentam em cena, consegue provocar imersão naquele universo tão rico e particular. A ideia de que tudo ocorre em tempo real é essencial para dar peso a ações geralmente imprevisíveis, tanto do palhaço quanto do homem.

“Bingo” consegue atrair o espectador sem que seja preciso recorrer a referências gratuitas e diretas ao período

A ambientação vai ainda além das aparências e de elementos que causam reação mais imediata, como os figurinos espalhafatosos e a trilha sonora recheada de faixas conhecidas. Telefones de modelos antigos e fitas cassete não são simples objetos de cena, mas meios pelos quais os personagens se expressam e, em certas ocasiões, dispositivos da trama — a sequência em que Augusto e o filho Gabriel (Cauã Martins) conversam ao vivo é exemplo disso. Por se sustentar em dinâmicas bastante específicas daquele contexto, “Bingo” consegue atrair o espectador sem que seja preciso recorrer a referências gratuitas e diretas ao período, tão comuns quando se trata da nostalgia oitentista.

Desta forma, nem mesmo as alterações nos nomes de pessoas e instituições (motivadas, entre outras coisas, por questões de direitos autorais) fica no caminho da imersão. Decisões como chamar a Rede Globo de Mundial parecem fazer parte de uma proposta de liberdade narrativa mais ampla, que não se prende exageradamente à fidelidade com o material de origem. Na prática, significa dizer que a rivalidade entre emissoras, por exemplo, tem importância não por ser um dado histórico, mas pelo enfoque oferecido a ela pelo próprio filme.

O diretor sabe usar o carisma do protagonista e a carga dramática acumulada ao longo do filme para construir um espetáculo final contido, mas cheio de força

Embora consiga encontrar soluções inventivas para contar uma trajetória relativamente familiar, o roteiro de “Bingo” enfrenta alguns problemas para organizar os múltiplos lados da vida de Augusto. As decepções com a mãe, o filho e a chefe são manifestações que têm a mesma origem, assim como os vícios, a dificuldade de lidar com o anonimato e o ressentimento com o canal que o rejeitou são parte do mesmo processo de autodestruição. Por vezes, contudo, essas questões são compartimentadas em grandes blocos temáticos que, sem a costura necessária, dão ao filme um caráter episódico.

Felizmente, essa impressão de que a trama precisa lidar com cada relação antes de avançar para o quadro seguinte desaparece por completo quando o desfecho se aproxima. Nessa altura, o que importa é a tragédia do personagem principal, consequência de um comportamento caótico que seguia o ritmo de um tempo de excessos. O diretor sabe usar o carisma do protagonista e a carga dramática acumulada ao longo do filme para construir um espetáculo final contido, mas cheio de força. Seu grande acerto está em permitir que a vida de Arlindo encaminhe os últimos acontecimentos naturalmente, sem manipulação emocional desnecessária ou reviravoltas inventadas. Aqui, é difícil imaginar significado mais poderoso que o da própria história — e é admirável que Daniel Rezende saiba disso já em seu longa de estreia na direção.

nota do crítico

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