“Straight Outta Compton” é um retrato potente sobre música e racismo • B9
Capa - “Straight Outta Compton” é um retrato potente sobre música e racismo

“Straight Outta Compton” é um retrato potente sobre música e racismo

Através da trajetória do N.W.A, diretor F. Gary Gray mostra o rap como a mais significativa música de protesto da transição entre séculos

por Virgílio Souza

⚠ AVISO: Pode conter spoilers

De muitas maneiras, “Straight Outta Compton” é um filme bastante convencional. Como o subtítulo nacional indica e o envolvimento de dois de seus personagens principais na produção revela, o projeto trata de contar “A História do N.W.A.” como uma típica biografia musical, maquiando algumas questões controversas e apresentando cronologicamente a trajetória de ascensão e queda dos artistas. O trabalho de F. Gary Gray (escalado para o oitavo “Velozes e Furiosos”) na direção, porém, é capaz de corrigir problemas comuns a exemplares dessa natureza, tornando o resultado final mais do que satisfatório.

No fim dos anos 1980, os amigos Dre (Corey Hawkins), Cube (O’Shea Jackson Jr.) e Eazy-E (Jason Mitchell), além de Ren (Aldis Hodge) e Yella (Neil Brown. Jr.), decidem formar um grupo de rap, apostando no poder e no valor de tratar questões até então marginalizadas na indústria. O retrato se constrói como uma clássica história de origens: eles se encontram, abordam paixões e planos semelhantes e decidem investir na ideia, a despeito de empecilhos como a descrença generalizada com relação ao gênero e ao potencial daquela empreitada. Sob esse aspecto, o que diferencia o longa de seus pares é o olhar atento aos indivíduos por trás daquela novidade, que não os santifica, embora evite problematizar algumas de suas falhas — machismo, misoginia e homofobia, por exemplo —, deslocando os maiores aspectos negativos para figuras secundárias.

O diretor F. Gary Gray, à direita, comanda o elenco

O diretor F. Gary Gray, à direita, comanda o elenco

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Há um mérito enorme na maneira como o trio principal é enquadrado. Gray parece controlar as ações de modo que seus personagens não saiam dessa — com o perdão do trocadilho — zona cinzenta em que o bem e o mal se confundem pela proximidade. Cube, Dre e Eazy são figuras geniais em vários sentidos, sobretudo no que diz respeito à música, essência de tudo.

A espontaneidade do processo criativo do grupo e sua postura de trazer uma realidade outrora negligenciada ao mainstream definitivamente ocupam espaço central aqui, e suas interpretações vão muito além da imitação de trejeitos ou da semelhança física. É impressionante também a forma como se portam em cena e reagem ao conflito, presente desde a primeira cena, quando o envolvimento com drogas é apresentado, se estendendo por toda a projeção. Os personagens possuem qualidades inegáveis e defeitos graves, mas não se elege um indivíduo como principal vilão.

O empresário Jerry Heller (Paul Giamatti) ocupa o posto por uma boa porção de tempo, mas as acusações contra ele surgem contrabalançadas por defesas, ainda que tímidas, sobre seu papel na explosão do N.W.A. Em seguida, é Suge Knight (R. Marcos Taylor) quem passa à condição de antagonista, tornando-se um empecilho para as pretensões de Dre. De todo modo, parte do sucesso como produtor do rapaz tem relação com a fundação da gravadora ao lado do colega-problema, já na década seguinte, e o filme valoriza isso nos momentos em que não precisa definitivamente mover a trama adiante.

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Poucos filmes desta natureza demonstram tanta naturalidade ao abordar seus elementos históricos. Assim, a biografia ganha contornos de sociografia.

Existe um componente que permeia tudo, do sucesso imediato aos rompimentos posteriores: a oposição do quinteto ao preconceito, personificado na truculência policial que os atinge diretamente desde o amadorismo até o estrelado. Parte daí uma das maiores qualidades de “Straight Outta Compton”: o vínculo dos músicos com suas origens. De maneira hábil, o filme dá ênfase a certos paralelismos que constroem esse embate entre a fidelidade e o distanciamento da cidade de origem do grupo.

Ao repetir as palavras do título em dois momentos, dando significados distintos em cada uma das situações, o texto transforma a região em personagem. A mensagem “saídos diretamente de Compton”, em tradução livre, inicialmente simboliza o orgulho do N.W.A. daquele local, nomeando seu álbum de estreia; posteriormente, encaixada na letra de “Vaseline”, de Ice Cube, aponta o abandono da vizinhança pelos seus colegas, tratando-os como traidores endinheirados.

Nesse sentido, é preciso valorizar a inserção de trechos dos noticiários reais, as aparições de figuras como Tupac (Marcc Rose) e Snoop Dogg (Keith Stanfield), as menções a eventos da época e as mudanças na composição dos personagens, inclusive no vestuário (entram os cordões de ouro, saem alguns princípios). Poucos filmes desta natureza demonstram tanta naturalidade ao abordar seus elementos históricos. Assim, a biografia ganha contornos de sociografia, mapeando com clareza aspectos próprios do universo em que os personagens estão inseridos.

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“Straight Outta Compton” indica que a realidade pode não ter mudado tanto em quase 30 anos, e é isso que torna o filme tão vivo e potente

Contribui para isso a relevância dada a fatos como o incidente envolvendo Rodney King, motorista de táxi atacado pela polícia de Los Angeles em 1991. Seu caso, registrado em vídeo e dono de enorme repercussão naquele momento, é constantemente mencionado, dando vida a muitas das polêmicas letras do N.W.A. Ainda, é interessante que o filme reforce a ideia do drama do homem negro ao colocar lado a lado a perseguição ao seu veículo pela LAPD e a fuga desenfreada de Dre pelas ruas da cidade, em um dos principais pontos de virada da trama.

Negativamente, vale notar que Gray deixa escapar esse eixo quando precisa dividir a atenção entre seus principais personagens. A fragmentação faz perder de vista o contexto histórico, trazendo o foco para desafios particulares e a condição da indústria e aproximando a narrativa das mais básicas cinebiografias de artistas.

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Mesmo assim, bons momentos compõe esse segmento, sobretudo quando a câmera comandada por Matthew Libatique cria planos capazes de reunir o trio: em uma sequência exemplar, Cube, Dre e Eazy são registrados ao lado de suas esposas/namoradas para, em seguida, a reconciliação ganhar forma. No âmbito pessoal, destaca-se também o arco percorrido por esse último, que parte da dificuldade em cantar por ser traficante de drogas, não vocalista, ascende ao posto de astro e retorna à impossibilidade de retomar as atividades com os antigos amigos em função de uma doença — no limite, adquirida no decorrer e também em função de sua carreira.

O diretor se recupera de maneira definitiva, contudo, ao resgatar o impacto do grupo para aquela geração e as seguintes, novamente enquadrando o rap como a mais significativa música de protesto da transição entre séculos. Os protestos por justiça e contra o preconceito, antes embalados por faixas como “Fuck Tha Police” e “Express Yourself”, agora têm na trilha artistas como Kendrick Lamar, outro filho de Compton e descendente direto do N.W.A. Sua aparição nos créditos finais não apenas reafirma esse legado, mas indica que a realidade pode não ter mudado tanto desde então, e é isso que torna o filme tão vivo e potente.

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