Este senhor grisalho ganha US$ 1.5 milhão por ano com podcasts
Em 2000 mudei para os EUA e as primeiras coisas que comprei foram a cama, a mesa do computador e a TV. O dinheiro só dava para isso. O primeiro canal que sintonizei foi o TechTV, que pode ser descrito como “o Food Network para geeks”. Programas de TV sobre tecnologia o dia todo. Isto era o sonho americano pra mim.
O líder do canal era um gordinho grisalho e elétrico, Leo Laporte, radialista veterano que tinha na época o único programa de rádio sobre tecnologia no país, no estilo “ligue e tire suas dúvidas”. Na TV ele apresentava o que eu só podia descrever como “um programa tipo Ana Maria Braga, para nerds”, The Screen Savers, que ia de dicas de programas a entrevistas. Ao vivo, todo dia no horário nobre.
O tempo passou, eu voltei ao Brasil em 2003 (passando pelo Canadá), o canal foi um fracasso e fiquei órfão da TechTV e dOs Screen Savers. Um belo dia resolvi googlar o nome do Leo e descubro que assim como eu várias pessoas estavam abandonadas e que o Sr. Laporte estava fazendo uma coisa que eu ainda não tinha ouvido falar: podcasts. “Um programa de rádio, só que em mp3” com toda a galera do TechTV chamado Revenge of The Screen Savers, nome que logo foi proibido de ser usado pela Comcast, dona do canal. Nascia ali o pod This Week in Tech, que acompanho (entre idas e vindas) até hoje e me serviu de inspiração para meus projetos de conteúdo digital que incluem o Braincast, BraincastTV e o enxame.
Na sexta, dia 2, Leo Laporte fez um keynote no congresso da ONA e contou um pouco da sua história. Como começou sua carreira na TV, como foi parar na TechTV, de onde veio a idéia da rede Twit e, o mais incrível, que seu empreendimento conseguiu o que o canal de TV jamais arranhou: é extremamente lucrativo, faturando 1 milhão e meio de dólares por ano em publicidade, com gastos de US$ 350 mil por ano.
O segredo de Leo não deveria ser novidade para quem é leitor do B#9: “Fale para a sua comunidade. Você não precisa atrair mais gente para seu público, ele já existe, você só precisa fazer com que ele descubra quem você é.”
“Quando fazíamos o Screen Savers o canal resolveu aumentar o público, já que tecnologia não era, na opinião deles, um assunto abrangente o suficiente para pagar os US$ 100 milhões de custo anual. O programa passou a ter quadros do tipo ‘O que Kenny Rogers tem em seu iPod?’, o que é ridículo já que esse assunto não agrada nem aos fãs do cantor nem aos entusiastas por tecnologia.”
Leo também conta que para os executivos uma TV para um público altamente qualificado era sinônimo de fracasso. Ele cita um dos executivos “Esse pessoal não compra produtos baseando-se em assuntos. Eles são informados. Eles pesquisam!” No que o palestrante emenda “Agora toda a programação da TV faz sentido, não é mesmo?” Para Laporte a mídia de massa parte do princípio de que seu público é imbecil.
É isso que eu costumo chamar, no enxame, de falar para dentro do seu público. Se o Fantástico (o programa mais de massa da nossa TV hoje) vai falar sobre o iPhone num bloco de 5 minutos ele vai perder quatro explicando o que é o telefone e o porquê de ele ser tão importante no mercado hoje em dia. Só no minuto final, com sorte, ele vai dar alguma informação útil para quem já sabe o que é um iPhone.
Uns caras que entendem muito bem disso são os já-não-tão-jovens nerds por trás do Nerdcast, premiados esta semana como melhor blog do Brasil pela MTV. No palco eles não se preocuparam em dizer o que era o programa, o que faziam. Fora uma deslizada do Alottoni no final (ele deve ter pensando “preciso fazer uma propaganda, estou em rede nacional!!!”) eles estavam ali conversando direto com seu público. Do lambda-lambda à piada “toma essa @cmerigo” os dois estavam ali falando para a sua galera, piada mais interna impossível. Quem quiser que entre na turma, tente descobrir as regras. Só quem tem um diálogo tão forte com sua comunidade consegue ser premiado melhor blog do Brasil em uma votação popular sem nem mesmo ter um blog e sim um podcast. O anunciante que continuar só olhando os números brutos de audiência e ignorar esse poder da comunidade vai morrer gastando mais e mais em filme de 30 segundos no Fantástico.
Já na parte de perguntas um jornalista pergunta se essa ultra-especialização da informação não é ruim, se as pessoas não precisam ser expostas a um panorama geral do mundo para não ficarem alienadas. A opinião de Laporte: “O conceito de mídia de massa é totalmente alienígena aos humanos. Em 5000 anos de história só tivemos mídia de massa nos últimos 100. O resto todo é de gente contando histórias importantes para sua comunidade.”
Abaixo o vídeo completo da palestra, com uns 40 minutos de duração. Obrigado Leo Laporte, se não fosse você eu não estaria aqui escrevendo no Brainstorm #9.
Foto por macinate
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