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O que torna “A Forma da Água” um filme especial?

Entenda como o grande vencedor do Oscar 2018 se tornou uma obra relevante por questões artísticas e sociais

por Matheus Fiore

O sucesso de “A Forma da Água”, mais recente obra de Guillermo del Toro, é indiscutível. Mas, para além dos feitos em premiações e reconhecimento de crítica e público, o filme que narra a história do romance entre uma faxineira muda e um ser místico oriundo da selva amazônica traz inúmeras características que fazem dele um caso diferente. “A Forma da Água” é relevante para o Cinema como indústria, como arte e para o relacionamento do público com a sétima arte. Isso não significa necessariamente que o longa seja uma obra-prima, mas sim que ele traz predicados que o tornam capaz de entrar para a história por trazer algo novo.

“A Forma da Água” permite alguns comentários interessantes sobre o Oscar, para começar. O último filme protagonizado por uma mulher a conquistar o prêmio de Melhor Filme havia sido “Menina de Ouro”, há mais de uma década, em 2005. Além disso, um longa-metragem predominantemente de fantasia não levava a estatueta mais importante da Academia para casa desde 2004, quando “Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei” saiu vencedor.

Mas, além de estatísticas e histórico da premiação, “A Forma da Água” traz questões importantes nas discussões de representatividade e, de quebra, apresenta subversões estéticas e narrativas importantíssimas para que haja um revisionismo de códigos do Cinema que por décadas dominaram a indústria e, hoje, estão datados – como o inerente machismo nas histórias de mocinhos salvando donzelas indefesas. Abaixo, você lerá uma análise de alguns dos pontos que tornam o filme de Guillermo del Toro uma obra de arte especial.

A desconstrução do Terror

A maior influência de “A Forma da Água” é, sem dúvidas, “O Monstro da Lagoa Negra”, obra de Jack Arnold que é a principal referência da saga de monstros da Universal. O próprio Guillermo del Toro chegou a dizer que “O Monstro” marcou sua infância, mas que sempre o provocou sentimentos estranhos, já que ele criou empatia pela criatura que, na obra de 1954, é um vilão a ser derrotado pelo clássico herói americano.

O público não teme a criatura, mas teme pela criatura e seu destino nas mãos dos humanos

Utilizando alguns dos elementos inerentes do terror – como o medo do desconhecido e criaturas misteriosas -, del Toro pega o gênero que o fascinou em sua infância e subverte. Em “A Forma da Água”, sua versão do monstro da lagoa negra na verdade não é o vilão, mas a vítima – que desde sua primeira aparição surge fragilizado e é agredido pelos humanos. Com isso, cria-se uma inversão total dos papéis dos personagens. O homem branco que no filme de 1954 é o grande herói, aqui, interpretado por Michael Shannon, é o vilão. O público não teme a criatura, mas teme pela criatura e seu destino nas mãos dos humanos que não a entendem nem a respeitam.

Subvertendo os contos de fadas

Outro ponto primordial na construção narrativa de “A Forma da Água” é o tratamento dado para o papel da “princesa”. Se pegarmos como exemplo filmes como “A Bela e a Fera”, as princesas sempre são retratadas como jovens meninas castas e de beleza exuberante. Já no longa de del Toro, Sally Hawkins vive Elisa, uma faxineira já adulta e que, em sua primeira aparição, se masturba em sua banheira. Além de deixar nítido que Elisa possui desejo e independência sexual – algo que costuma ser exclusivo das figuras masculinas no Cinema – a cena permite que, imediatamente, qualquer possibilidade de atribuir inocência à protagonista seja quebrada.

Del Toro deixa nítido que Elisa possui desejo e independência sexual – algo que costuma ser exclusivo das figuras masculinas no Cinema

Elisa também é apresentada como uma pessoa “pronta”. Ciente de suas limitações e das dificuldades que encontra em uma sociedade que menospreza sua existência, a faxineira não é uma donzela esperando ser resgatada. Assim como inverte os papéis entre a Criatura e o homem branco, Guillermo del Toro inverte os papéis entre o herói e a mocinha. A obra traz uma protagonista pronta para agir de forma autônoma e resgatar quem ama – algo que é raro de se ver até em filmes protagonizados por mulheres.

Representatividade

Além de ser uma mulher adulta e sexualmente independente, Elisa é muda. No elenco de apoio, a protagonista tem a companhia de Zelda (Octavia Spencer), mulher negra e também funcionária do laboratório, e Giles (Richard Jenkins), o amigo homossexual com quem Elisa divide seu apartamento. O fato de um filme com atenção midiática escolher centrar sua história em figuras que representam minorias é importante para que haja uma redefinição no “DNA” das produções de fantasia. Em tempos de igualdade de gênero, uma obra que tire do homem branco heterossexual o protagonismo pode não ser uma revolução estética para o Cinema, mas é um caminho para que a arte audiovisual alcance um novo público e o faça se sentir representado em tela.

“A Forma da Água” foge do maniqueísmo e consegue dar profundidade para o antagonista: Strickland não é a personificação do mal, mas também é uma vítima

A figura clássica do homem branco heterossexual e de família tradicional fica, ironicamente, nas mãos de Richard Strickland, o vilão interpretado por Michael Shannon. Del Toro, porém, foge do maniqueísmo e consegue dar profundidade para o antagonista: Strickland não é a personificação do mal, mas um sujeito que também é vítima de um sistema opressor. Vale lembrar que Richard vive sob pressão de seus superiores para realizar seu trabalho sem erros, de modo que, quando confrontado ou intimidado por seus chefes, ele exibe uma faceta frágil e carente de reconhecimento por seus esforços. A obra ainda consegue brincar com os sentimentos de Richard ao estabelecer que o personagem possui desgosto pela cor verde para, mais à frente na história, trazê-lo comprando um carro… Verde. Simplesmente por ser um modelo caro. Para sentir-se encaixado na sociedade, Strickland compra um veículo que representa um elemento que ele odeia, simplesmente pelo impacto social de possuir aquele automóvel.

O fantástico como salvação

Assim como em “O Labirinto do Fauno”, “A Forma da Água” traz um final lúdico e fantástico, mas que deixa certa melancolia por seu contexto. Após ser assassinada por Strickland, Elisa é revivida pela Criatura e ambos passam a viver no mar, distante da civilização. É como se o mundo como conhecemos, cheio de preconceito e violência, não fosse merecedor da presença de duas figuras tão únicas como são Elisa e a Criatura.

Del Toro oferece novo olhar e um novo Cinema para tempos de mais amor e igualdade

Se por um lado esse final é feliz para Elisa e para a Criatura, não deixa de ser um desalento o fato de o público nunca ter direito a conhecer a vida que o casal viverá após o reencontro na água. Como se a sociedade representada no filme não merecesse acompanhar a felicidade de Elisa – é, afinal, uma sociedade que a maltratou e subjugou por toda sua vida. Del Toro dá à sua protagonista a conclusão que, na vida real, para os oprimidos e subjugados, só existe na arte: o escapismo.

“A Forma da Água”, portanto, é um filme de inúmeros valores, sejam eles sociais ou artísticos. É uma obra de arte capaz de criar empatia pela subversão de clichês que por décadas ditaram o tom das narrativas do Cinema e que, hoje, sob a luz da conscientização e da empatia, podem ser revistos e proporcionar uma nova abordagem para gêneros como a fantasia e o terror. Um novo olhar e um novo Cinema para tempos de mais amor e igualdade.

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