Brasil é o país que proporcionalmente mais gasta com Cannes Lions
Proporção ajuda a explicar escolha inédita como "Creative Country of the Year" e reforço como modelo de negócio das agências brasileiras
O Brasil estreia em 2025 como “Creative Country of the Year”, primeiro país a receber o novo selo concedido pelo Cannes Lions – uma homenagem à trajetória de ideias premiadas que projetou a publicidade brasileira no cenário global.
Cannes Lions enxerga no país não só um celeiro de ideias, mas seu cliente mais fiel
O troféu, porém, também reconhece um dado muitas vezes ignorado fora do mercado: nenhum outro país investe tanto em inscrições quanto o Brasil quando se leva em conta o tamanho da economia.
Foram 2736 peças enviadas nesta edição, o que equivale a 1287 inscrições para cada US$ 1 trilhão de PIB. Na comparação proporcional, o Brasil supera os Estados Unidos em quase 480% e deixa para trás mercados tradicionais como Reino Unido, França e Alemanha.
A conta ajuda a explicar por que o festival enxergou, no mercado brasileiro, mais que um celeiro de ideias: viu também seu maior cliente relativo, já que lideramos com folga esse ranking global de “intensidade criativa”.
| País | Inscrições 2025 | PIB (US$ tri) | Peças/US$ 1 tri | vs. Brasil |
|---|---|---|---|---|
| Brasil | 2.736 | 2,13 | 1.287 | — |
| Argentina | 549 | 0,62 | 886 | –31 % |
| Reino Unido | 2.349 | 3,84 | 612 | –52 % |
| Canadá | 1.167 | 2,23 | 524 | –59 % |
| México | 685 | 1,60 | 428 | –67 % |
| França | 1.271 | 3,21 | 396 | –69 % |
| Estados Unidos | 6.797 | 30,51 | 223 | –83 % |
| Alemanha | 914 | 4,75 | 192 | –85 % |
| Japão | 547 | 4,18 | 131 | –90 % |
Fontes: Inscrições por mercado: Cannes Lions 2025; PIB nominal 2025: FMI, WEO Apr/24.
Por que o Brasil virou “Creative Country”
A escolha do Brasil como primeiro “País Criativo do Ano” em Cannes Lions ganha novo contexto diante dos números. Nenhum outro país demonstra tamanho comprometimento financeiro proporcional com o festival.
Com investimento estimado entre R$ 14,8 mi e R$ 18,4 mi (dependendo do mix de categorias e prazos, confira matemática mais abaixo), o Brasil destina a Cannes o equivalente a 0,00016 % do PIB nacional – pode parecer pouco em termos absolutos, mas é proporcionalmente cerca de sete vezes a fatia dedicada pela Alemanha, por exemplo.
América Latina, continente criativo
O fenômeno não é exclusivamente brasileiro. Os dados revelam que a América Latina domina o ranking de intensidade criativa:
- Brasil: 1.287 peças/trilhão
- Argentina: 886 peças/trilhão
- Colômbia: 524 (US$ 0,36 tri PIB)
- Peru: 446 (US$ 0,27 tri PIB)
- México: 428 peças/trilhão
É cultural. Enquanto outros mercados podem ver Cannes como apenas mais um festival, a América Latina trata o evento como validação existencial – e isso se reflete nos números: as inscrições vindas da região cresceram 16 % em 2025, salto que reforça a obsessão latina por disputar Leões mesmo em meio a economias ainda em desenvolvimento.
Mas para o Brasil também é um modelo de negócio.
A economia do prestígio
Cannes funciona como atalho comercial: um Leão eleva contas, atrai talentos e justifica fees
Com gasto do mercado publicitário nacional projetado para crescer 7,9% em 2025 (chegando a R$ 92,5 bilhões), o investimento em Cannes representa uma aposta de que o reconhecimento global justifica o custo.
Não se trata apenas de ego. Para quem olha de fora, gastar tanto num país de renda média parece contrassenso. Mas, dentro das agências, Cannes funciona como atalho comercial: cada Leão eleva a conta em concorrências, atrai talentos e viabiliza até aberturas de escritórios internacionais. Em outras palavras, o troféu converte-se em receita futura – principalmente nos jobs regionais e globais que as redes mandam para suas representantes brasileiras depois de um ano premiado.
Para agências brasileiras, Cannes não é custo de vaidade; é linha de marketing. Um Leão abre portas, atrai clientes e justifica fees mais altos de um jeito que, talvez, não aconteça em outros mercados.
A homenagem póstuma a Washington Olivetto, com seus 50+ Leões, fecha o círculo: uma geração inteira de publicitários brasileiros construiu carreira em cima de troféus. Questionar o investimento é questionar a própria identidade e o modelo de negócio do mercado.
O custo real de competir em Cannes
A matemática de Cannes é complicada porque cada inscrição tem preço diferente, dependendo de dois fatores: a categoria escolhida e quando você inscreve.
Como funciona a tabela de preços*:
Categorias básicas (Design, Radio, Outdoor)
- Inscrição antecipada: R$ 4.300
- Última hora: R$ 7.000 (+63%)
Categorias premium (Film, Entertainment)
- Inscrição antecipada: R$ 6.800
- Última hora: R$ 9.600 (+41%)
Categoria Titanium (a mais prestigiada)
- Inscrição antecipada: R$ 14.800
- Última hora: R$ 17.500 (+18%)
Com esse mix de prazos e categorias, as 2.736 inscrições brasileiras devem custar cerca de R$ 16,5 milhões no total – uma média de R$ 6.000 por peça.
Confira a tabela de cenários
| Cenário | Pressuposto | Custo total (€) | Custo total (R$) | Custo médio por peça |
|---|---|---|---|---|
| Conservador | todas as 2 736 inscrições a € 850 (faixa “básica” + early-bird) | € 2,33 mi | R$ 14,74 mi | € 850 ≈ R$ 5 390 |
| Realista | mistura de faixas + 60 % early, 25 % regular, 15 % late (ver modelo mix) | ≈ € 2,60 mi | ≈ R$ 16,48 mi | € 950 ≈ R$ 6 020 |
| Late-entry | grande parte enviada nos últimos prazos | ≈ € 2,90 mi | ≈ R$ 18,39 mi | € 1 060 ≈ R$ 6 720 |
O que isso significa?
Com 7,2% das inscrições virando shortlist em 2025 (finalistas):
- Cada finalista custa: R$ 83.000
- Se repetir 2024 (92 Leões de 2.066 inscrições): cada troféu pode custar R$ 146 mil
*valores aproximados
Em 2025, o Brasil mantém a aposta máxima, com pelo menos três Grand Prix já garantidos pelo país até o momento. 1.287 peças por trilhão de PIB não é apenas número, é declaração de que, para o mercado brasileiro, Cannes não é despesa.
É investimento. E torcida.

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